Todos meus dias são iguais. Menos quarta-feira, que é menos igual. Acordo, atravesso a cidade, chego no prédio, pego a chave na portaria e entro no apartamento da foto
A única foto do apartamento é de uma mulher que nunca vi em pessoa. Nem sei se é a mesma que mora aqui. Passo a quarta-feira entre panos, vassouras, aspirador, sabão e a foto.
Lavanderia, cozinha, a foto, quartos e banheiro. Banheiro, quartos, a foto, cozinha e lavanderia.
Aquela foto na sala não tem nada com o apartamento. Nem fico me perguntando a razão de estar lá. Mas não tem nada com nadica de nada.
Apartamento sem vida, sem cor. Minha casas, a três conduções daqui, não tem foto. Mas também não tem essa secura. Para que todos meus dias sejam iguais, sempre deixo a cortina da sala aberta. Assim, o sol ardido da tarde vai desbotando a foto.