O Caipira no Museu

Landscape in Brazil - Frans Jansz Post - 1652/Rijksmuseum


Passa Maneco e abanque-se. Pegue um café que saiu agurinha mesmo. Tava esperando vancê
mesmo. Vamô descansa um cadiquinho enquanto a cabocrada tão fazendo a festa. Eles tão me atazanando com esse baruio. Ôta povo que gosta de azucriná!

Ôce já sabe que atrudia eu fui vê o neto do meu ermão que é surjão em São Paulo? Eu já le falei que nasceu mais um do filho do caçula d’ele? Pois é… Vou te colocar a par. Num queria ir. Vancê sabe como eu num gosto de passarinhar por ai. Mas a Maricota, sabe cumé… Ela é bem saída, num pode ter um convite que já quer sair se enveredando por aí.

Tentei num ir, mas nhã Maria me amolou tanto e ficou de birrância comigo. Acabei indo de canto chorado. Num trago boas alembranças da urtima vez que fui pra lá. É muita parentada junta cheia de terete-tetê. Fico azuretado com aquela gentarda. Mas porém, Maricota gosta, sabe cumé… No mais, ela lá ficou toda de caimento pageando o catatauzinho.

E lá fui eu com toda a minha imbirrância pr’aquela cidade catinguenta e agreste e cheia de topetudo. Mas meu ermão como é sabido, sabendo de tudo, sempre me leva pra longe da parenteada. E lá fomo nós pescocear nas vereda da cidade.

Meu ermão é veiaco nessas coisas de ficar atôa. Dessa vez me levou pr’um museu diferente. Escuita só, Maneco: o museu num tinha as coisa de museu. Aquelas coisa do arco-da-véia num tinha não.

Sabe o que tinha Maneco? Coloca a xicra na mesa purque vancê vai ficar aério qui nem
eu fiquei! Tinha uns apareio que tinha as nossa palavra. Eita mesmo Mané! Vou te dá um izempro: vapô, arterice, chinchar, sopapear, guarecer, manhêra… Era uma variedade de palavra que num acabava mais.

Magina só Maneco, quando vi tudo aquilo fiquei ansim qui nem tê levado um croque na
cabeça. Pra esparecê fui pitá. Vortei num átimo e tinha um menina de cabelo cor de banana que viu que fiquei moleado com aquilo e ela me expricou que tudo aquilo que tava no apareio era nosso lugar de fala. Maneco, agora a gente tem ôtro lugar pra cuidar, purque ela disse que a gente tem que preserva isso. Ara ara homi! Maneco, mais uma coisa pra gente lidá!

Voltei pra casa do meu ermão com o isprito pinicando. Num consegui pôsar direito. Fiquei titubeando quieto pra num acordá Maricota. Ela fica de pendenga comigo se levantar no meio do sono. Sabe cumé sua ermã… Intonces, avaluei a situação, acochei os pensamento. E cheguei numa solução. Se eles cuida das nossa palavra, vamos cuidá das deles. Arre Maneco! Vamu guarda o lugar de fala deles todo! Num vamu ficá pra trás nessa pareia com eles não!

Sabendo de tudo isso, inteirei o mais velho do meu ermão da situação. Despois ele me
voltou com uma penca de palavra que só eles fala. Izempio, quando ancê tá miqueado, eles falam que tão sem ‘budiguete’. Ôtra, quando a gente quer mandar recado, lá é ‘mandar um zapi’. E mais: ‘tapaué’ é o nosso farnel.

Intão, Maneco, anota elas na sua cabeça, depois passa pro Antonho anotar na dele. E pro
Chico que é o que mais se alembra de tudo. Vamu preservá o lugar de fala deles purque eles já preserva o lugar de fala de nóis.

Imagem: Landscape in Brazil – Frans Jansz Post, 1652Rijksmuseum

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